Eric Hobsbawn: “Se a humanidade não mudar sua convivência mútua e com o planeta, o futuro nos preserva maus agouros” |
em 15/06/2009 |
Entrevista publicada na Revista Sem Terra, junho 2009 |
quarta-feira, 24 de junho de 2009
Eric Hobsbawn: “Se a humanidade não mudar sua convivência mútua e com o planeta, o futuro nos preserva maus agouros”
quinta-feira, 18 de junho de 2009
LGBT Protestam Contra Violência Homofóbica Pós-Parada, Neste Sábado
O grupo Corsa, a APOGLBT e o Forum Paulista LGBT se uniram em um protesto previsto para acontecer neste sábado (20), na Av. Dr. Vieira de Carvalho, a partir das 19 horas.
Outras entidades poderão aderir ao ato, durante a semana.
Maiores informações com:
APOGLBT - Alexandre Santos (98190171) e Cezar Xavier (99631528)
CORSA - Julian Rodrigues (8380-2629) e Lula Ramires (71715055)
Fórum Paulista LGBT - Alessandro Melchior (17-91281688), Jane Pantel , Paulo Mariante (19-9339411) e Carla Machado (95374156)
A Associação da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (APOGLBT) emitiu nota em repúdio aos casos de violência homofóbica ocorridos após a 13ª. Parada do Orgulho, neste domingo (14). O grupo Corsa e o Fórum Paulista LGBT se uniram à APOGLBT num protesto previsto para acontecer neste sábado (20), na Av. Dr. Vieira de Carvalho, a partir das 19 horas.
Informação de qualidade e o jornalismo brasileiro
Na última quarta (17), o Supremo Tribunal Federal brasileiro decidiu pelo fim da exigência do diploma para o exercício do jornalismo. A decisão foi oriunda de um recurso extraordinário, interposto pelo Ministério Público Federal e pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo.
Como o tema é polêmico e tem gerado muitos pontos de vista, cabe passar rapidamente pelos argumentos que fundamentaram a decisão. Não se trata de um argumento de autoridade, apenas uma informação preliminar – visto que a polêmica foi gerada a partir dos fundamentos da Constituição Federal. Se o leitor já estiver a par da discussão, pule esta parte.
São citados na CF os artigos 5, 102 e 220, nos trechos já separados abaixo:
A exigência de diploma do curso superior de jornalismo para exercício da profissão, como muitos profissionais sabem, data do regime militar e está prevista no art. 4º, inciso V, do Decreto-Lei n° 972/1969 (leia aqui).
O MPF cita ainda violação ao art. 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos, ratificada pelo Brasil em 1992. Reproduzo abaixo o artigo (orignal aqui, em PDF).
Artigo 13º – Liberdade de pensamento e de expressão.
O voto final pode ser acessado aqui.
Dado esse cenário, é saudável retomar a discussão, sem esquecer que claramente os fundamentos não são baseados em abstrações dos juristas no alto de seus cargos, e sim em uma ampla discussão pública, em que múltiplas partes estiveram envolvidas durante décadas.
Se o foco, pra começo de conversa, for o diploma em si, acho a discussão inútil. Nunca me posicionei e continuo a não me posicionar, porque para mim pouco muda. O campo da comunicação já está totalmente aberto. Blogs, revistas, redes de comunicação. O mundo mudou. Gostaria de ver uma pesquisa indicando que muda alguma coisa a partir desta decisão. Duvido, mas me interesso na pesquisa.
Nenhum dos nossos nobres jornalistas conhece gente do campo profissional da Administração fazendo coluna em revista semanal? Ou médico em programa televisão? Todos sabemos que nas redações ninguém pede diploma. Se houvesse de fato fiscalização do Ministério do Trabalho, a grande imprensa parava. TV Globo, JB, O Globo, Estadão, FSP, todos os meios paravam, com raras exceções. Todos sabem disso.
A pessoa é chamada porque efetivamente faz jornalismo, porque sabe fazer jornalismo. O meio de comunicação que não souber fazer jornalismo rapidamente perderá, em tempos de internet, a credibilidade – o bem maior do jornalismo. E a Folha de S. Paulo, diga-se de passagem, tem se esforçado – vide o spam sobre a Dilma que virou manchete. E não só a Folha. A prática, aliás, se repete e virou a vergonha nacional de uma classe, em tempos de vigilância virtual. Honestamente, que acha que o jornalismo brasileiro é o locus da ética pública precisa se informar. Nenhum jornalista ou comunicador da grande imprensa acredita nisso. Existem bons jornalistas apesar do jornalismo que se faz.
É uma saída confortável dizer que essa decisão piora o quadro. A internet expôs uma crise que não é de hoje. Essa crise, na minha opinião, se chamacrise de representatividade. Há muito tempo a imprensa de grande alcance não é mais representativa, no sentido que Negri dá (por exemplo). São vozes que abandonaram suas tentativas sempre frustradas de influenciar na pauta, sem nunca serem ouvidas, e não querem mais ficar restritas à seção de “cartas”.
O jornalismo brasileiro não entendeu, por exemplo, que a seção de cartas foi extinta com o advento da internet. O leitor que tem dois reais pra comprar um jornal tem dinheiro pra pagar horário na lan house. E prefere a lan house. Entre muitas outras questões. E, por isso, o jornalismo deixou de ser, pouco a pouco, locus principal do debate. Migramos (todos) para a rede – social e tecnológica. E o jornalista perdeu sua centralidade (mas não sua importância, óbvio, apenas a centralidade).
Eu questiono: as pessoas pararam de ler jornal por causa da decisão do STF? Não, eles estavam parando, antes, e parando cada vez mais, e continuam parando. Baixou a escolaridade? Não. Aumentou. Mudaram, isso sim, os hábitos. Dar um tiro no pé é não entender que o mundo mudou..
E pra quem acha que está mal a “classe”, eu tenho interface profissional com médicos e advogados, por dever de ofício e estudo. Ambos (a “classe”) estão ameaçados. Tentando se defender como podem, mas extremamente ameaçados.
No caso dos médicos, em alguns casos se fecham em suas sociedades, tentando processar por todos os lados quem os ameaça: médicos estrangeiros, práticas orientais. Tudo é alvo, porque a profissão anda mal das pernas. Mas eles foram mais inteligentes: melhoraram primeiro o ensino, para depois pensar no “mercado”. Fortaleceram a associação de educação médica, se organizaram para reivindicar a qualificação rigorosa dos cursos em todo o país. A FENAJ também tentou, mas abandonou equivocadamente sua preocupação central com o ensino (leia aqui) pra priorizar a bandeira do “jornalista por formação”, que não centra a questão principal: qual formação?
No corpo editorial de três revistas que eu participo, há historiadores, sociólogos, educadores, assistentes sociais… e jornalistas. Eu mesmo tento convencer amigos há anos que sou radialista, sem sucesso. Curiosamente, a diversidade das informações é maior nestes meios independentes, porque não se fala só em política e polícia. Qual a proposta que temos, por exemplo, para que o ensino nas faculdades brasileiras não forme os jornalistas que conduzirão o repeteco monotemático da pauta da grande imprensa? Ou acreditamos que o que existe essa imprensa representa, de fato, toda a diversidade do nosso país e do mundo?
O ministro Franklin Martins colocou recentemente uma visão redonda, na minha opinião: o aquário está “se achando”. Pior para o jornalismo e para os jornalistas – principalmente aqueles que juram de pés juntos questionar o aquário, mas estão cada vez mais como peixes fora d’água dentro de um modelo de jornalismo falido.
Leio atentamente o debate que atualmente explode na internet, sobre o tema. E percebo que tudo foge da questão corporativa. São os problemas do jornalismo capitalista (quem tem “donos”), a falta de ética de alguns editores, o exemplo valoroso de grandes jornalistas não-formados, a conceituação ampliada da questão da informação (que nunca terá dono). Enfim, um mundo de coisas. No fim das contas, pensa só, uma das consequências da decisão do STF é, na verdade, um grande benefício: a mobilização – agitação, reorganização, reconfiguração, fortalecimento – dos jornalistas, que agora vão procurar novas formas de se organizar. E podem se unir de modo mais inteligente.
O que não é razoável é entrar num debate em que jornalistas que fazem o jogo da grande imprensa, com todo o esquema da pauta pronta, dizem, agora, que são os porcos capitalistas que determinaram a votação, em favor do Capital. Tô fora.
E olha que eu acho útil a imagem do Capital – que deve ter recebido essa notícia como alguém que comemora ao ter ganho 100 reais na raspadinha da lotérica. Nada demais. Nada de novo.
sexta-feira, 12 de junho de 2009
A universidade não é caso de polícia
A universidade não é caso de polícia
VLADIMIR SAFATLE
Em vez de estigmatizar os alunos e tratá-los como delinquentes, talvez seja o caso de se perguntar contra o que eles se manifestam |
AS CENAS de batalha campal que vimos nesta semana na USP ficarão na memória daqueles que dedicam sua vida a essa instituição. Vários professores, como eu, que nunca participaram de movimento sindical, que nem sequer foram alguma vez a uma assembleia, veem com estarrecimento a disseminação da crença de que conflitos trabalhistas devem ser resolvidos apelando sistematicamente à polícia.
Diz-se que a polícia era necessária para evitar piquetes e degradações. No entanto, tudo o que ela conseguiu foi acirrar os ânimos e aumentar exponencialmente os dois.
Vale a pena lembrar que, por mais que sejam práticas problemáticas que precisam certamente ser revistas, os piquetes estão longe de se configurarem como ações criminosas. A história das sociedades democráticas demonstra como eles foram, em muitos casos, peças necessárias de um processo de ampliação de direitos. Cabe a nós provar que esse tempo passou e que, devido à capacidade de diálogo, tais práticas não têm mais lugar.
No entanto, quando se tenta reduzir manifestantes que procuram melhorias em suas condições de trabalho a tresloucados patológicos que nada têm a dizer, que não têm nenhuma racionalidade em suas demandas, dificilmente alguma forma de diálogo conseguirá se impor.
Melhor seria começar explicando qual racionalidade justifica que a universidade mais importante do país, responsável por parte significativa da pesquisa nacional, tenha salários menores que os de uma universidade federal em qualquer Estado brasileiro.
Por outro lado, há algo incompreensível na crença de que a polícia possa ser chamada para mediar conflitos com alunos e funcionários públicos. Muitos acreditam que ligarão para o 190 e receberão uma espécie de “polícia inglesa” capaz de agir de maneira minimamente adequada diante de cidadãos que se manifestam.
Contudo, o que vimos até agora foi uma polícia que entrou pela primeira vez no campus armada com metralhadoras, quando a ação padrão deveria ser, nessas situações, agir desarmada. Quem tem uma metralhadora nas mãos imagina que porventura poderá usá-la. Mas contra quem? Contra nossos alunos? E quem decidirá o momento de usá-la?
Como se isso não bastasse, uma polícia bem preparada não responde a provocações de gritos e latas com bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha usadas na frente da Escola de Aplicação e de uma faculdade em que, normalmente, há crianças e adolescentes. O que aconteceria se uma bala de borracha atingisse uma criança, ampliando um pouco mais o enorme contingente de balas perdidas disparadas pela polícia?
Antes de ligar para a Polícia Militar, valeria a pena levar em conta seu despreparo manifesto em intervenções em conflitos sociais, histórico catastrófico mundialmente criticado por órgãos internacionais.
Nenhum leitor terá dificuldade de se lembrar de situações de conflito social nas quais policiais que se sentiram acuados reagiram de maneira descontrolada, provocando tragédias.
Por fim, contrariamente a certa ideia que um anti-intelectualismo militante gosta de veicular nestes momentos, vários alunos alvos de balas de borracha são extremamente dedicados em seus cursos, participam sistematicamente de colóquios e programas de pesquisa, apresentam “papers” em congressos e podem ser constantemente encontrados em nossas bibliotecas.
Sendo certo que vêm de todas as faculdades de nossa universidade (e não apenas da área de humanas, como alguns querem fazer acreditar), é inaceitável tratá-los como delinquentes potenciais. Dentre os 2.000 estudantes que se manifestaram nesta semana estão alguns de nossos melhores alunos.
Em vez de estigmatizá-los, talvez seja o caso de se perguntar contra o que eles se manifestam, já que, é sempre bom lembrar, antes da entrada da polícia, nem professores nem alunos estavam em greve. A greve restringia-se a funcionários.
Há um mês, em uma pequena cidade francesa, a polícia recebeu um chamado de possível furto. Em uma atuação “exemplar”, ela estava em alguns minutos no local do crime. No entanto, o local era uma escola, o objeto furtado, uma bicicleta, e o possível ladrão, uma criança de dez anos. Sem pestanejar, a polícia retirou a criança da escola na frente de seus colegas, levou-a à delegacia, colheu seu depoimento e a fichou.
Possivelmente, foi contra esse modelo social baseado na incapacidade de resolver conflitos sem apelar à mais crassa brutalidade securitária que hoje nossos alunos se manifestam. Cabe a nós mostrar a eles que a história da USP é outra.
http://blogdofavre.ig.com.br/2009/06/a-universidade-nao-e-caso-de-policia/
quarta-feira, 10 de junho de 2009
Professor relata ação violenta da tropa de choque na USP
Professor relata ação violenta da tropa de choque na USP
O professor Pablo Ortellado, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades, da Universidade de São Paulo, relata com indignação a ação da tropa de choque da Polícia Militar no campus da USP. Ortellado defende que a comunidade acadêmica deve se mobilizar "diante desses fatos gravíssimos, que atentam contra o diálogo, o bom senso e a liberdade de pensamento e ação". "Hoje me envergonho da nossa universidade ser dirigida por uma reitora que, alertada dos riscos, autorizou que essa barbárie acontecesse num campus universitário", afirma.
Pablo Ortellado
Prezados colegas,
Eu nunca utilizei essa lista para outro propósito que não informes sobre o que acontece no CO (transmitindo as pautas antes da reunião e depois enviando relatos). Essa lista esteve desativada desde a última reunião do CO porque o servidor na qual ela estava instalada teve problemas e, com a greve, não podia ser reparado. Dada a urgência dos atuais acontecimentos, consegui resgatar os emails e criar uma lista emergencial em outro servidor. O que os senhores lerão abaixo é um relato em primeira pessoa de um docente que vivenciou os atos de violência que aconteram poucas horas atrás na cidade universitária (e que seguem, no momento em que lhes escrevo – acabo de escutar a explosão de uma bomba). Peço perdão pelo uso desta lista para esse propósito, mas tenho certeza que os senhores perceberão a gravidade do caso.
Hoje, as associações de funcionários, estudantes e professores tinham deliberado por uma manifestação em frente à reitoria. A manifestação, que eu presenciei, foi completamente pacífica. Depois, as organizações de funcionários e estudantes saíram em passeata para o portão 1 para repudiar a presença da polícia do campus. Embora a Adusp não tivesse aderido a essa manifestação, eu, individualmente, a acompanhei para presenciar os fatos que, a essa altura, já se anunciavam. Os estudantes e funcionários chegaram ao portão 1 e ficaram cara a cara com os policiais militares, na altura da avenida Alvarenga. Houve as palavras de ordem usuais dos sindicatos contra a presença da polícia e xingamentos mais ou menos espontâneos por parte dos manifestantes. Estimo cerca de 1200 pessoas nesta manifestação.
Nesta altura, saí da manifestação, porque se iniciava assembléia dos docentes da USP que seria realizada no prédio da História/ Geografia. No decorrer da assembléia, chegaram relatos que a tropa de choque havia agredido os estudantes e funcionários e que se iniciava um tumulto de grandes proporções. A assembléia foi suspensa e saímos para o estacionamento e descemos as escadas que dão para a avenida Luciano Gualberto para ver o que estava acontecendo. Quando chegamos na altura do gramado, havia uma multidão de centenas de pessoas, a maioria estudantes correndo e a tropa de choque avançando e lançando bombas de concusão (falsamente chamadas de “efeito moral” porque soltam estilhaços e machucam bastante) e de gás lacrimogêneo. A multidão subiu
correndo até o prédio da História/ Geografia, onde a assembléia havia sido interrompida e começou a chover bombas no estacionamento e entrada do prédio (mais ou menos em frente à lanchonete e entrada das rampas).
Sentimos um cheiro forte de gás lacrimogêneo e dezenas de nossos colegas começaram a passar mal devido aos efeitos do gás – lembro da professora Graziela, do professor Thomás, do professor Alessandro Soares, do professor Cogiolla, do professor Jorge Machado e da professora Lizete todos com os olhos inchados e vermelhos e tontos pelo efeito do gás. A multidão de cerca de 400 ou 500 pessoas ficou acuada neste edifício cercada pela polícia e 4 helicópteros. O clima era de pânico. Durante cerca de uma hora, pelo menos, se ouviu a explosão de bombas e o cheiro de gás invadia o prédio. Depois de uma tensão que parecia infinita, recebemos notícia que um pequeno grupo havia conseguido conversar com o chefe da tropa e persuadido de recuar. Neste momento, também, os estudantes no meio de um grande tumulto haviam conseguido fazer uma pequena assembléia de umas 200 pessoas (todas as outras dispersas e em pânico) e deliberado descer até o gramado (para fazer uma assembléia mais organizada). Neste momento, recebi notícia que meu colega Thomás Haddad havia descido até a reitoria para pedir bom senso ao chefe da tropa e foi recebido com gás de pimenta e passava muito mal. Ele estava na sede da Adusp se recuperando.
Durante a espera infinita no pátio da História, os relatos de agressões se multiplicavam. Escutei que a diretoria do Sintusp foi presa de maneira completamente arbitrária e vi vários estudantes que tinham sido espancados ou se machucado com as bombas de concusão (inclusive meu colega, professor Jorge Machado).
Escutei relato de pelo menos três professores que tentaram mediar o conflito e foram agredidos. Na sede da Adusp, soube, por meio do relato de uma professora da TO que chegou cedo ao hospital que pelo menos dois
estudantes e um funcionário haviam sido feridos. Dois colegas subiram lá agora há pouco (por volta das 7 e meia) e tiveram a entrada barrada – os seguranças não deixavam ninguém entrar e nenhum funcionário podia dar qualquer informação. Uma outra delegação de professores foi ao 93o DP para ver quantas pessoas haviam sido presas. A informação incompleta que recebo até agora é que dois funcionários do Sintusp foram presos – mas escutei relatos de primeira pessoa de que haveria mais presos.
A situação, agora, é de aparente tranquilidade. Há uma assembléia de professores que se reuniu novamente na História e estou indo para lá. A situação é gravíssima. Hoje me envergonho da nossa universidade ser dirigida por uma reitora que, alertada dos riscos (eu mesmo a alertei em reunião na última sexta-feira), autorizou que essa barbárie acontecesse num campus universitário.
Estou cercado de colegas que estão chocados com a omissão da reitora. Na minha opinião, se a comunidade acadêmica não se mobilizar diante desses fatos gravíssimos, que atentam contra o diálogo, o bom senso e a liberdade de pensamento e ação, não sei mais. Por favor, se acharem necessário, reenviem esse relato a quem julgarem que é conveniente.
Cordialmente,
Prof. Dr. Pablo Ortellado
Escola de Artes, Ciências e Humanidades
Universidade de São Paulo
Mais Informações em:
http://www.idelberavelar.com/
http://carosamigos.terra.com.br/
http://www.revistaforum.com.br/sitefinal/
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16028
segunda-feira, 8 de junho de 2009
Me olhe, me toque, me diga qualquer coisa. Ou não diga nada, mas chegue mais perto.
Não seja idiota, não deixe isso se perder, virar poeira, virar nada. Daqui há pouco você vai crescer e achar tudo isso ridículo.
Antes que tudo se perca, enquanto ainda posso dizer sim, por favor, chegue mais perto?
(Caio Fernando Abreu)
sexta-feira, 5 de junho de 2009
Sobre o Castigo
O primeiro e mais inocente de todos os tipos de coação é aquele empregado para repelir uma demonstração concreta de força. Embora tenha muito pouco a ver com qualquer forma de instituição política, merece, mesmo assim, ser examinado em primeiro lugar. Suponhamos, por exemplo que haja uma espada apontada contra o meu peito, ou de outra pessoa qualquer, sob ameaça de morte iminente. Neste caso, devo ocupar-me de evitar um dano que parece inevitável e parece não haver tempo para experiências. E no entanto, mesmo aqui, uma investigação rigorosa nos sugerirá dúvidas importantes. Os poderes da razão e da verdade são ainda incomensuráveis.
A verdade que um homem não consegue comunicar em menos de um ano, outro poderá transmitir numa quinzena. A menor palavra pode ter uma compreensão poporcional ao seu tamanho. Quando Marius recebeu o soldado que fora enviado à sua cela para assassiná-lo, dizendo-lhe com olhar severo e expressão cheia de autoridade:"Miserável! Tens a temeridade de matar Marius!" e com esas poucas palavras colocou-se em fuga, foi porque a grandeza da idéia concebida pela sua mente chegou com força irresistível à mente do seu algoz. Ele não tinha armas para resistir, nem ímpeto para ameçar; estava debilitado e sozinho. Foi apenas pela força do sentimento que conseguiu desarmar seu exterminador. Mesmo que houvesse, neste caso, falsidade e preconceito na idéia transmitida, podemos deixar de acreditar que a verdade é ainda mais forte? Seria bom para a espécie humana se a esse respeito todos pudessem ser como Marius habituados a colocar uma confiança indômita na força da inteligência. Quem poderá dizer o que seria impossível para homens assim ousados e movidos pnas pelos sentimentos mais puros? Quem poderá dizer até onde poderia ir a espécie humana, se deixasse de respeitar a força nos outros e se recusasse a utilizá-la em seu próprio proveito?
A diferença que existe, entretanto, entre essa espécie de coação e a outra espécie que geralmente recebe o nome de castigo é bastante óbvia. O castigo é utilizado contra o indivíduo cuja violência já cessou de existir. No momento, ele não está ocupado em qualquer atividade hostil contra a comunidade ou qualquer um de seus membros. É provável que esteja tranquilamente dedicado a ocupações que lhe são benéficas e não fazem mal a ninguém. Sob que pretexto deve este homem sofrer qualquer tipo de violência?
Para previnir. Previnir o que? Previnir qualquer mal que ele pudesse vir a cometer. É este exatamente o argumento que tem sido utilizado para justificar as mais medonhas formas de tirania. Que outros argumentos justificaram a inquisição, os espiões e as várias formas de censura dirigidas contra a opinião? Sob a alegação de que há uma íntima ligação entre as opiniões dos homens e a sua conduta; que sentimentos imorais levam, muito provavelmente, à prática de atos imorais. Em muitos casos, não há razão que nos leve a supor que um homem, que já roubou uma vez, tem mais probabilidade de voltar a fazê-lo do que aquele que dissipou sua fortuna nas mesas de jogo, ou do que um outro acostumado a afirmar que, numa emergência, não teria escrúpulos de recorrer a este expediente.
Nada pode ser mais óbvio do que pensar que, sejam quais forem as precauções tomadas com relaçãoao futuro, só com extrema relutância a justiça concordaria em incluir entre essas precauções os atos de violência contra o meu vizinho. Atos que tanto mais injustos, quanto supérfluos. Por que não me armar de cautela e energia, em vez de fazer encacerar todos os homens que minha imaginação ordena que eu tema, paraque eu possa passar meus dias em tranquila ociosidade?
Se em vez de aspirar ao dóminio sobre um vasto território, alimentando a sua vaidade com idéias de império como até agora fizeram, as comunidades se contentassem com um pequeno distrito e uma cláusula prmitindo a formação de uma confederação em caso de necessidade, cada indivíduo viveria então aos olhos do público. A desaprovação dos vizinhos, um tipo de coação que não tem origem nos caprichos dos homems mas no sistema do universo, iria inevitavelmente obrigá-lo a regenerar-se ou a emigrar. Resumindo todos os argumentos contra este tema, diríamos que todo o castigo infligido com o objetivo de previnir é um castigo sob suspeita, a forma de punição mais contrária à razão e mais arbitrária quanto à sua aplicação que poderia ter sido imaginada.
O segundo objetivo a que se propõe o castigo seria, pelo que se pode imaginar, a regeneração. Sob este aspecto, igualmente há várias restrições a fazer. A coação não convene nem concilia, mas, ao contrário, acaba por alienar a mente daquele contra o qual é utiliza-da. A coação não tem nada a ver com a razão, não sendo, portanto, a forma mais adequada de cultivar a virtude. É certo que a razão nada mais é do que um confronto e uma comparação entre várias emoções e sentimentos, mas é preciso que estes sentimentos sejam aqueles originalmente provocados pelos fatos e não quaisquer outros que uma vontade arbitrária, estimulada pelo poder de que dispõe, quiser provocar. A razão e onipotente; se minha conduta estiver errada, uma simples observação, partindo de uma visão clara e abrangente, fará com que pareça tal aos meus olhos. Nem é provável que haja em mim qualquer obstinação perversa que me leve a persistir no erro contra todas as recomendações com as quais a virtude pudesse estar investida e toda a beleza com que pudesse ser exibida.
Mas a isto poder-se-ia responder dizendo:"esta visão sobre o assunto pode ser realmente verdadeira em sentido abstrato, mas não é no que concerne à presente inperfeição das capacidades humanas. O requisito essencial para a reforma e o aperfeiçoamento da espécie humana parece ser o estímulo da mente. É por esta razão que a escola da adversidade tem sido tantas vezes considerada como escola da virtude. Quando a vida transcorre sem percalços, nossas capacidades ermanecem adormecidas. Mas quando surgem as dificuldades, dir-se-ia que a mente reage à altura. As dificuldades despertam a força e geram a energia. Muitas vezes acontece que quanto mais reprimido eu estiver, mais crescerão minhas capacidades, até que eu acabarei destruindo todos os obstáculos erguidos pela tirania."
A idéia sobre os benefícios da adversidade baseia-se num erro bastante óbvio. Se pusermos de lado o paradoxo e a singularidade, perceberemos que se a adversidade é um mal, há um outro mal ainda pior. A mente humana não consegue desenvolver-se se não receber idéias. E crescerá mais em meio a desgraça do que no embotamento. Muitas vezes descobriremos que o homem que foi tratado com rigor terá se tornado mais sábio ao fim da sua vida do que aquele tratado com desdém. Mas o fato de que o rigor seja um dos meios para estimular o pensamento não significa que possa ser o melhor deles.
Já foi demonstrado que a coação, em termos absolutos, é injustiça. Poderá a injustiça ser a melhor maneira de difundir os princípios da equidade e da justiça? A tirania é a mais funesta de todas as coisas. Pois o que é a tirania , senão aquilo que habituou a humanidade a tanta ignorância e tanto mal por tantos milhares de anos? Mas será possível que essa mesma tirania, que tão terríveis consequencias teve, poderia, em outras circunstâncias, ser uma fonte de benesses? Qualquer tipo de coação exacerba a mente. Aquele que sofre a coação é persuadido, na prática, da necessidade de uma filantropia suficientemente ampla entre aqueles com os quais se relaciona. Ele aprende que a justiça só trunfa com grandes limitações e que ninguém deve esperar ser tratado com justiça. A lição que aprende é esta: "Submeta-se à força, renuncie a razão. Não se deixe guiar pelas suas convicções mas pelos aspectos mais vis da sua natureza - o medo da dor e um respeitoso temor pela injustiça praticada por outros. Foi assim que Elisabeth da Inglaterra e Frederico da Prússia foram educados na escola da adversidade. Mas o benefício que obtiveram com esse tipo de educação foi que com ela aprenderam a encontrar, dentro de si próprios, os recursos que lhes permitiram aceitar com espírito indômito a violência utilizada contra eles. Será esta a melhor maneira de formar o homem para a prática do bem? Em caso positivo, talvez se torne necessário, além disso, que a coação que usemos seja de uma injustiça flagrante, já que o progresso parece estar não na submissão, mas na resistência. Mas não há dúvida de que a verdade é a forma adequada de estimular a mente, sem que seja precisorecorrer à adversidade, por verdade entendemos aqui uma visão justa de todos os atrativos do trabalho, do conhecimento e da bondade. S e eu sou capaz de reconhecer o valor de qualquer ocupação, po que não deverei entregar-me a ela? Ese sou capaz de entendê-la com toda a clareza, por que não haverei de empenhar-me com zelo e didicação? Se souber como despertar a minha mente, apelando para os sentimentos mais nobres e verdadeiros da minha natureza. Mas, para que isso aconteça, é necessárioque você mesmo entenda, em profundidade, aquilo que quer merecomendar: é preciso que seu cérebro tenha absorvido todos os dados e que você possa expressar com clareza e total convicção suas próprias opiniões. Se estivéssemos acostumados a uma educação em que a verdade não fosse jamais desprezada por preguiça, ou expressa de forma traiçoeira, capaz de diminuir seus méritos; uma educação na qual o professor se sujeitasse à eterna procura da melhor forma para transmiti-la com objetividade e vigor mas sem qualquer preconceito ou aspreza; é impossível deixar de acreditar que esta educação seria mais eficaz para o desenvolvimento da mente do que qualquer outra forma de coação, fosse ela agressiva ou benevolente, que jamais tenha sido inventada.
O último objetívo a que se propõem o castigo é o exemplo. Tivessem os legisladores limitado suas opiniões à reforma e prevenção, este afã de usar o poder de que dispõem, embora equivocado, ainda teria a marca da humanidade. Mas a partir do momento em que a vingançaé apresentada como um estímulo para a ação, ou como medonha forma de exemplo, nenhuma barbárie foi considerada demasiado grande. E um egenho cruel ocupou-se em descobrir novas maneiras de torturar a vítima ou de tornar o espetáculo mais impressionante e horrível.
Há muito se observou que essa orientação raramente atinge os seus objetivos. Enquanto novas, todas as formas mais refinadas da crueldade produzem uma certa impressão que logo desaparece - e todo o alcance dessa invenção tenebrosa se esgota em vão. A razão disso é que, seja qual for a força com que a novidade atingiu a imaginação, a natureza inerente à situação logo reaparece e faz valer o seu poder supremo.
Sentimos então necessidades prementes da conjuntura a que estamos sujeitos e sentimos - ou pensamos sentir - os ditames da razão instigando-nos a satifazê-las.
Sejam quais forem as idéias que tivermos sobre as determinações da lei, elas surgem com sinceridade, embora talvez com alguns erros, das condições básicas da nossa vida. Comparamo-las com o depotismo que a socedade exerce como entidade coletiva e quanto mais fizermos, maiores serão nossos murmúrios e a nossa indignação contra as injustiças que sofremos. Mas a indignação não é um sentimento que sirva para conciliar; a crueldade não possui qualquer das qualidades da persuasão. Ela pode inspirar terror mas é incapaz de produzir em nós candura e docilidade.
Assim feridos pela injustiça, nossos sofrimentos, nossas tentações e toda a eloquencia dos nossos sentimentos manifestam-se repetidas vezes. É por acaso admirar que acabem triunfando?
O castigo utilizado como exemplo está sujeito a todas as objeções já utilizadas contra o castigo como forma de previnir ou regenerar e a outras mais que lhe são peculiares. Pois, no caso, o castigo é utilizado contra uma pessoa que no momento não está cometendo nenhuma ofensa e da qual podemos apenas suspeitar que alguma vez chegará a fazê-lo. Não admite discussão e exige de nós que consideremos este tipo de conduta como um dever, apenas porque isso é apraz aos nossos superiores e porque eles esperam que, através do exemplo, poderão fazer com que não nos obstinemos a pensar de qualquer outra maneira. Além disso, devemos lembrar que, quando me fazem sofrer um castigo - seja ele justo ou injusto - apenas para que eu sirva de exemplo a outras pessoas, estou sendo tratado com arrogante desdém, como se eu fosse incapaz de qualquer sentimento. Se quem me castiga está sendo justo, seria necessário que houvesse em mim alguma coisa que me tornasse merecedor deste castigo
-seja um deserto absoluto, o que seria absurdo, seja algum mal que eu pudesse praticar ou, finalmente, que existisse, no castigo que me infligem, alguma coisa capaz de provocar a minha regeneração.
Se qualquer uma delas for a razão que torna justo o sofrimento que me está sendo infligido, então não há nada que justifique a utilização do castigo como exemplo: ele pode ser uma consequencia incidental do processo mas não é parte integrante do princípio. Fazer com que um indivíduo seja objeto de tortura ou morte, sem outra razão senão a de fazer com que aqueles que assistem possam aprender alguma coisa com seu sofrimento é, sem dúvida, uma forma extremamente superficial e injusta de guiar os sentimentos da humanidade.
(William Dodwin - investigação sobre a justiça política, 1793: texto retirado do livro os grandes escritos anarquistas)