segunda-feira, 19 de julho de 2010

Casamento Igualitário na Argentina, e no Brasil?

Por Augusto Patrini

Interessante perceber que algumas pessoas no Brasil, de forma hipócrita, escondem seu preconceito, sua homofobia com discurso "racional" e / ou conciliatório. Todos nós sabemos que o Brasil sofre de uma hipocrisia estrutural histórica, e os brasileiros têm a triste mania de não falar claramente o que pensam. Escondem-se, mas, no dia-a-dia discriminam, são racistas, machistas e homofóbicos. Triste, essa hipocrisia impede que o país avance.

Gostaria muito de ao menos ver um debate realmente franco por aqui. Como o que aconteceu recentemente na Argentina sobre o Casamento Gay ou Igualitário. Entretanto nem isso parece ser possível por essas terras brasileiras. É por isso que o projeto de lei de União Civil entre pessoas do mesmo sexo, de autoria de Marta Suplicy, hoje já mais que caduco, está há mais de 15 anos, desde 1995, no parlamento e nem ao menos foi discutido! Hipocrisia? Sim. Negue-se a debater o assunto, e você estará escondendo de forma "elegante" seu preconceito e sua homofobia.

Engraçado que ninguém em sã consciência teria a coragem de alegar "objeção de consciência" para debater problemas relacionados ao racismo, seria imediatamente tachado de racista. Engraçado que alguns parlamentares, ditos progressistas, alegam justamente essa “objeção" para não votar, ou não discutir a questão da homofobia (Ex: Marina Silva, Tião Viana) e da equiparação de direitos civis entre heterossexuais e homossexuais (casamento gay, etc).

O fato é que temos que aprender muito com nossos hermanos argentinos. Não importa se jogam um melhor ou pior futebol que nós brasileiros, importa que esbanjam civilidade. Devíamos deixar nossa arrogância e olharmos com admiração e respeito às conquistas dos argentinos. Devíamos estudar a sociedade , para com ela aprendermos.

Exemplos de civilidade argentina?

  • Na Argentina, 95% da população é alfabetizada, enquanto no Brasil, 75% da população economicamente ativa é analfabeta funcional (está aí um grande gargalo para o desenvolvimento do país). Diga-se de passagem, que a Argentina fez uma revolução educacional ainda no século XIX, enquanto nós apenas avançamos nos últimos oito anos do governo Lula, e ainda muito modestamente… Vocês querem mais?
  • A Argentina julgou e puniu ditadores e torturadores, no Brasil eles ainda estão no nome de rodovias e ruas, ou piores são deputados e senadores. Tenho vergonha quando vejo alguns senadores na TV senado, sendo que alguns deles deveriam estar presos ou sendo julgados por seu envolvimento com a ditadura.
  • O governo Lula convocou a CONFECOM, para tentar discutir democraticamente como acabar com o monopólio midiático que sufoca nosso país. Esta foi atacada, desprestigiada e atacada por integrantes do próprio governo (Ex: Hélio Costa – ministro das Comunicações), e as ideias tiradas da conferência foram tachadas pela grande mídia de Chavistas. Absurdo? Não: Brasil. Na Argentina, o governo da presidenta CFK apresentou um projeto de Lei reformando a regulamentação da mídia, que era do tempo da ditadura, a chamada "Ley de los Medios", que ao ser aprovada está quebrando monopólios (como do grupo Clarín) que por sinal são muito menos poderosos que no Brasil. A lei divide as concessões de mídia entre sociedade civil, empresários e governo, e é uma conquista enorme da democracia argentina. (ao contrário do que a grande mídia brasileira disse não tem nada de chavista, e é muito democrática! Basta ler o texto da lei.)
  • Agora mais essa! Os argentinos, objeto de chacota de brasileiros arrogantes, aprovaram em um amplo debate no parlamento e na sociedade, não somente a equiparação civil entre os cidadãos, sejam heteros ou Homos, como o Casamento Igualitário (chamado pela imprensa do Brasil de casamento gay.) O que a lei argentina na verdade faz, é retirar do artigo do código civil o trecho que o casamento é formado por "um homem e uma mulher", substituindo-o por "duas pessoas". Algo bastante simples, mas que dá isonomia republicana de direitos aos cidadãos argentinos e corrige injustiças enormes sofridas por gays, lésbicas e transexuais. Uma coisa que me chamou a atenção é a percepção dos argentinos que a votação da lei não dizia respeito somente aos Gays, mas aos princípios básicos de igualdade e liberdade da República Argentina. Por isso, foi possível ver nos debates um grande envolvimento de heterossexuais defendendo o Casamento Igualitário.(Ex: No programa da Tv Pública Argentina 678 !)

No Brasil a antiquada lei da União Civil – que não equipara heteros e homos – proíbe adoção, nem ao menos foi discutida pelo parlamento! É por isso que a solução que o governo Lula (PT), simpático a causa, foi determinar que a Advocacia Geral da União entre com uma ação determinando que o artigo do "novo" código civil – que já nasceu pré-histórico – que determina que casamento acontece somente entre "um homem e uma mulher" seja considerado inconstitucional e discriminatório. Isso por que a Constituição Federal já diz que todos os cidadãos são iguais perante a lei. Não precisa ser da área jurídica para perceber que o dito artigo do Código Civil é claramente inconstitucional.

Vale neste momento perguntar-nos a razão pela qual o parlamento brasileiro é tão conservador e atrasado… quem escolhe os deputados e senadores que lá estão? Os argentinos? Claro que não! Somos nós brasileiros. Então nessas eleições não somente votemos em candidatos do legislativo comprometidos com estas causas, como nos mobilizemos socialmente, como o fazem os argentinos, para exigir dos parlamentares justiça, liberdade, dignidade e Igualdade.

Outro dia li um "artigo" no Estadão que dizia que a questão do "casamento gay" deve ficar fora do debate eleitoral… ! Ora, quem determina isso? O jornal? A mídia? Os partidos? Não, povo, somos nós! Então se queremos o Casamento Gay ou igualitário aprovado no Brasil vamos impor o debate, pois esse, como cidadãos, é nosso direito político e constitucional. Vale lembrar que a importância do tema dos direitos a livre orientação sexual são muito importantes em um país que um dos campeões mundiais de assassinatos homofóbicos, se não me engano somente no ano de 2009 foram trezentos. Recentemente em São Gonçalo um menino de 14 anos foi brutalmente sequestrado e torturado até a morte, apenas por que era gay. Pois então, está mais que na hora do tema da homofobia e dos direitos iguais entre homossexuais e heterossexuais entrar nas pautas políticas, jornalísticas e do movimento social. Depende de nós!

É isso. Abraços.

PS: Queria ver as organizações LGBTs brasileiras, que por sinal, têm dinheiro, promoverem uma mobilização social parecida com a que foi feita pelos argentinos da Federación Argentina de Lesbianas, Gays y Trans, ou dos "Putos Peronistas". Quem faz a maior Parada Gay, poderia muito bem promover uma campanha de conscientização, e mobilização não? Vale a pena ver os vídeos produzidos pelo INADI argentino: Objetos é ótimo!

PS2: O Brasil está tão atrasado na questão dos direitos civis, que nem ao menos fez o básico, criminalizando a homofobia! Ou seja, em nosso país, ainda se têm o direito de excluir, e ferir moralmente pessoas apenas por que estas não fazem parte da heteronormatividade. Algo urgente precisa ser feito.

13 comentários:

Raiza disse...

Muito legal o texto.Mas sobre o debate do casamento igualitário lembrei de um post da Mary w.Ela dizia que os direitos humanos não deviam passar por votação.Eu concordo,o casamento gay,junto com uma série de outros direitos devia ser aprovado e ponto.Se a gente perguntasse pra sociedade brasileira se ela quer dar direitos, a gente ainda teria escravidão aqui.

Raiza disse...

Muito legal o texto.Mas sobre o debate do casamento igualitário lembrei de um post da Mary w.Ela dizia que os direitos humanos não deviam passar por votação.Eu concordo,o casamento gay,junto com uma série de outros direitos devia ser aprovado e ponto.Se a gente perguntasse pra sociedade brasileira se ela quer dar direitos, a gente ainda teria escravidão aqui.

rayssa gon disse...

concordo com tudo.

o pior é aguentar aquelas piadas hiper-machistas seleção argentina + conquista do casamento gay.

e pra não dizer que eu não curto piada, eu acho que os gays e lesbicas argentinos desfrutam agora do direito de serem infelizes tanto quando os hetero. :D

Weverton Andrade disse...

Liindo!!
É hora e mudar!! E claro que o casamento gay é uma pauta!!

Podemos ser melhores!!

Não quero votar em alguém que seja conservador ou não aceite os homossexuais, por mais que vivemos num país democrático o mínimo é aceitar o outro, uma questão de respeito e não de gosto! Uma questão de sobrevivência,

"eu não irei votar nos três patetas" Rita Lee disse isso no 23º Inverno Cultural de São João Del Rei dia 17/07/2010

BlogMuié disse...

Gostei da forma como o texto trata a questão do casamento gay também como uma forma estrategica para dar linha ao encaminhamento de uma sociedade mais justa e igualitária! Tais leis que resistem a alterações mostra o atraso que o Brasil se encontra em diversos aspectos. Também não acho que é uma questão de ir pra pebliscito.

Bruno Bimbi disse...

Amigo, eu sou argentino -embora atualmente more no Brasil- e fui um dos responsáveis da campanha pela legalização do matrimônio entre pessoas do mesmo sexo. Eu apenas queria te dizer que tanto essa campanha como o projeto de lei e as ações de inconstitucionalidade dos artigos 172 e 188 do Código Civil(ações cujo texto redigi junto com dois advogados) foram realizadas pela Federação Argentina de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trans (que representa a mais de 40 organizações de todas as províncias), e não pela CHA, que é uma organização histórica da cidade de Buenos Aires, muito reconhecida, mas minoritária no movimento LGBT argentino. De fato, a CHA se opôs a tudo o que a gente fez, já que eles defendiam a união civil e eram contra o matrimônio. Apenas alguns meses antes da aprovação da lei, quando já quase tudo estava feito e eles perceberam que a lei seria aprovada, mudaram de opinião e começaram a apoiar o nosso trabalho.
Eu sei que isso é apenas um detalhe na matéria que você escreveu, mas queria te contar como foi a história.
Um grande abraço e tomara que o Brasil seja o próximo país a reconhecer a igualdade! Eu gostaria de ajudar com a experiência adquirida na nossa luta na Argentina para que isso seja possível.

Guy Franco disse...

Inveja de argentinos, desde sempre. Me deu vontade de casar com o seu texto. Agora é ver como eu posso fazer isso. Queria ter poder de mobilização. Será que eu tenho? Todos têm, indeed...

E mando beijos.

FOXX disse...

entendo seu ponto de vista, mas não considero o Brasil hipócrita. Ele é homofóbico e só. Vivemos num pais q ser gay te torna um cidadão de segunda classe e eu não vejo ninguém fingindo que isso seja mentira. Somos perseguidos e logo, começaremos a ser exterminados.

#MagnetoFeelings

Murilo Rodrigues Guimarães disse...

Sinceramente, penso que a maior parte dos brasileiros, inclusive e talvez principalmente, os 'analfabetos funcionais', se contasse com boa informação, seria favorável ao casamento igualitário.

Acredito haver um comprometimento tácito (e por isso hipócrita) de amplos setores da Justiça, da Política e das Comunicações para com a homofobia. Tantos morrem e tão poucos debates nos meios de ocmunicação, nada de leis que nos protejam dessa cultura do extermínio.

Os Grupos organizados LGBT precisam, urgentemente, rever suas práticas e estabelecer uma agenda de mobilização, que abranja, inclsive, campanhas midiáticas e manifestos políticvos.

Contuto, entristece-me ver que, numa Parada Gay como a de São Paulo, por exemplo, as pessoas prefiram ainda festejar futilmente e exibirem corpos artificiais a encararem a importante missão de agregar forças para garantir direitos.

Sou absolutamente contra esta cultura da estética vazia entre os gays. Ela enfraquece o movimento, na medida em que nos divide e nos afasta, como um preconceito endógeno. São os grupos organizados que devem, primordialmente, politizar suas manifestações, sejam elas concursos de Miss ou seminários em universidades.

Vejo a comunidade homossexual brasileira, talvez por uma deficiência historicamente construída entre os movimentos de defesa de minoria, equivocada quanto aos métodos e mesmo quanto aos objetivos. As falas mais conscientes são abafadas, seja pelo despreparo, seja pela indiferença dos setores modais. Novas lideranças precisam sair do armário!

Há uma causa esquecida, esta mesma que os Argentinos levaram a cabo e nos passaram, mais uma vez, á frente. Parabéns aos hermanos. Devemos mto a eles e precisamos passar a enxergar isso... e correr atrás deles.

Abraços,
Parabéns pelo texto.
Vamos à luta!

@sobrecomum disse...

A Argentina só conseguiu aprovar o casamento gay depois que julgou e prendeu seus ditadores, alfabetizou sua população, e elegeu uma mulher para a presidência. Isso significa que eles amadureceram como democracia.

O Brasil ainda precisa avançar antes que possamos realmente debater o casamento gay.

A população está muito aconstumada a concordar com a televisão ao invéz de questionar sua real utilidade.

Sempre que eu vejo um candidato sendo sabatinado, perguntam pelo aborto, pelo casamento gay e pela legalização das drogas como se esses fossem os temas mais relevantes para o país.

Temos uma Copa do Mundo e Olimpíadas pela frente. Nossa economia e educação pública precisam ser fortalecidas.

O Rio de Janeiro foi o penúltimo colocado na última pesquisa sobre ensino fundamental e médio e é o terceiro em número de mortes motivadas por homofobia.

Para mmim uma coisa está ligada a outra.

Augusto Patrini Menna Barreto Gomes disse...

Caro Tiago,

Discordo. Direitos Civis são básicos para se conseguir os direitos sociais e econômicos,...
Além disso, o tema dos direitos LGBTs são importantes uma vez que essa população, estimada em mais ou menos 10% do total sofre uma grande exclusão social, e violência (física e simbólica) cotidiana! Ignorar isso é dar mostra de falta de solidariedade. Talvez você não saiba mas o Brasil é campeão mundial de assassinatos de gays, lésbicas e trans.

A questão do aborto é sim importante! É um caso grave de saúde pública. Todos os meses no Brasil, centenas de mulheres, principalmente as pobres, morrer por causa de tentativas de aborto sem orientação médica. O aborto não é um problema criminal, mas de saúde pública e social.

Educação é importante sim, mas isso não quer dizer que algo não tenha que ser feito, antes que a educação seja boa no Brasil, até por que isso vai demorar muito. Esse argumento parece o velho argumento estalinista, que falava que a questão de libertação feminina ou gay seria resolvido após a revolução e o comunismo instaurado na terra...

Agora falar de Olimpiadas e Copa, quando o assunto diz respeito aos direitos civis de milhares de brasileiros mostra uma falta de sensibilidade enorme.

É tão difícil a #esquerda entender isso?

Abraços

@sobrecomum disse...

Sei que a emenda pode ficar pior que o soneto e mesmo assim vou arriscar. Em primeiro lugar sou gay e militante. Conheço os homossexuais que morrem espancados e já fui atacado mais de uma vez na rua.

Depois, queria dizer que não há um aprofundamento no debate sobre os direitos LGBTs porque a população não sabe que que precisamos deles. Os crimes de ódio estão sendo pouco divulgados e os programas de TV que abrem espaço para o debate chamam uma celebridade instantânea e um líder religioso para trocarem acusações sem embasamento nenhum. O movimento gay por mais organizado que seja, só conseguirá algum avanço na legislação quando tiver apoio de outros setores da sociedade e isso depende de divulgação de informações e de debates sérios a respeito de assuntos como adoção e homofobia. Assuntos esses anteriores em importância ao casamento gay porque as perdas são muito maiores já que não temos uma legislação própria. Mas como convencer uma população a nos apoiar se ela não desenvolveu o censo crítico, não sabe fazer uma interpretação de texto e tem sido manipulada pela televisão e por grupos religiosos para cumprirem tarefas sem questionar?

Dieguito Bairros disse...

Fantástico em suas colocações Augusto, mas a sociedade brasileira ainda tem seus conservadores e defensores da nunca existente moral, oras precisamos perceber que moral e bons costumes nunca fizeram parte deste cenário desolado e de desigualdade que sempre foi o Brasil. Parabéns Augusto