segunda-feira, 6 de outubro de 2008




Por que nada era fácil e que sentia essa fúria surda sair-lhe por entre os dentes brancos. Estivera sonhando todo esse tempo. Sentia-se oco, apavorado, triste e furioso, adornado com um ódio discreto que lhe injetava os olhos de sangue, e que lhe tirava o sono. E aos poucos o deserto-lhe ia tomando-lhe a alma, e deixava-se tragar pela areia movediça dos afazeres cotidianos e cada vez sentia que tudo aquilo que julgavam mais lindo e importante não era mais do que merda. O que lhe parecia importar em horas tontas, de besta esperança era algo de sublime e louco, um fogo intenso que devora a alma e a vida de poucos homens, mas que os fazem, mortos prematuros, porém estatuas grandiloqüentes. Entretanto, sabia, secretamente que não podia sair deste encerramento, daquele quarto branco, daquela solidão imensa, que sua carne seria devorada por mais vermes, que já devoram a carne da humanidade há mil anos, e que sua alma não era nada mais que um borbulhar físico-químico tolo e fortuito. E nessas horas , enfim, descobria que seu amor e ódio por todos os homens era tão grande e forte que lhe escapavam por entre os poros, nos fluidos e suores, nas tardes quentes de vespas e zumbidos, trancando-lhe a garganta, dando-lhe tonturas intermináveis e descobrindo-lhe essa eterna fome que devora no fundo a mais primitiva e tola célula de todos as carnes vivas. E julgava-se só, perdido, e vivo, para então descobrir enfim, os caminhos da morte e da dor.

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