terça-feira, 4 de novembro de 2008

A História por Jean Baudrillard II

“Isto sempre foi para mim, não um método, mais uma forma de antecipação: ir por antecipação ao fim do processo, para ver o que acontece além. Eu penso sempre que o que acontece ou poderia se passar além, é de fato aqui, em processo mesmo, e que o fim está já aqui, desde o começo. Tudo se desenvolve ao mesmo tempo. Os começos e os fins andam em paralelo. Isto transforma evidentemente um pouco de todo o campo das causas e efeitos, passa-se como que um pouco por cima disto!... Isto que dizer, eu não vejo nenhum meio, como Canetti parecia acreditar, de retornar ao ponto onde a distinção era possível entre o Bem e o Mal, o Verdadeiro e o Falso, etc. Dito de outra forma, o retorno às condições de um exercício racional e tradicional do pensamento. Minha visão é sem duvida mais catastrófica, mas não no sentido apocalíptico, mais no sentido de uma revolução ou de uma mutação das coisas. E esta mutação se deve a uma aceleração: tenta-se caminhar cada vez mais rápido, mesmo que de fato já se tenha chegado ao fim. Virtualmente! Mas já estamos lá mesmo assim.”

Tradução: Augusto Patrini

« Cela a toujours été pour moi, non une méthode, mais une forme d’anticipation : aller par anticipation au bout d'un processus, pour voir ce qui se passe au-delà. Je pense toujours que ce qui se passe, ou pourrait se passer au-delà, est en fait déjà là dans le processus même, et que la fin est déjà là, à partir du commencement. Tout se développe en même temps. Les commencements et les fins marchent en parallèle. Cela bouleverse évidemment un peu tout le champ des causes et des effets, on est passé un peu au-delà!... Cela dit, je ne vois aucun moyen, comme Canetti semblait le croire, de revenir au point où la distinction était possible entre le Bien et le Mal, le Vrai et le Faux, etc. Autrement dit, de revenir aux conditions d'un exercice rationnel et traditionnel de la pensée. Ma vision est sans doute plus catastrophique, mais pas au sens apocalyptique, plutôt d'une révolution ou d'une mutation des choses. Et cette mutation est due à une accélération : on essaie d'aller de plus en plus vite, si bien qu'en fait on est déjà arrivé à la fin. Virtuellement ! Mais on y est quand même. »
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“De fato, isto renviava para mim [a problemática da antologia, da história assombrada por sua disparição, etc] ao problema mais geral da realidade, entendendo-se que a realidade não é nada mais que um princípio. O “Princípio de realidade”, a realidade objetiva e o processo de reconhecimento que ela exige, desapareceram de alguma forma... Neste momento preciso, a realidade liberada de seu principio torna-se um desenvolvimento exponencial, integral. Tem-se então que construir uma realidade onde tudo é operacional, ou onde nada mais resta fora de seu campo. Se tudo se realiza ou se completa, é sobretudo, baseado no desaparecimento da “essência”, do “transcendente” ou do “princípio” da realidade. Esta base espectral nos leva, de uma certa forma, ao virtual, e a todos estes mundo onde reina a virtualidade”

Tradução: Augusto Patrini

« En fait, cela renvoyait pour moi [la problématique de la hantologie, de l'histoire hantée par sa disparition, etc.] au problème très général de la réalité, attendu que la réalité n'est rien d'autre qu'un principe. Le « Principe de réalité », la réalité objective et le processus de reconnaissance qu'elle appelle, disparaissent en quelque sorte… À ce moment précis, la réalité délivrée de son principe devient, dans un développement exponentiel, intégrale. On a alors à faire à une réalité où tout est opérationnalité, ou plus rien ne reste hors champ. Si tout se réalise ou s'accomplit, c'est d'abord sur la base de la disparition de l' « essence », de la « transcendance » ou du « principe » de la réalité. Cette base spectrale nous mène, d'une certaine façon, au virtuel, et à tous ces mondes où règne la virtualité. »
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“Estas historias assim são uma forma de “reparação”. Se eu quero analisar o terrorismo, eu não vou fazê-lo em função do discurso islâmico. É uma forma de exorcizar as coisas em vez de reenviá-las a uma religião, a uma ideologia, a uma convicção. Se eu observo o terrorismo, é o ato terrorista enquanto que fratura de uma potência mundial. Isto pode vir não importa de onde, e que existam convicções religiosas por trás não interessa. O ressurgimento dos discursos étnicos, religiosos, lingüísticos mostra que alguma coisa se convulsiona, se cristaliza contra a hegemonia, contra o “Império”, contra este pensamento único, esta potência única. Alguns o chamam de choque entre culturas, um choque de ideologias... Mas isto é insolúvel. Tomar partido contra ou a favor, não me interessa. Aquilo que eu procuro ver, é o antagonismo verdadeiro. Ora, o antagonismo se manifesta de um modo simbólico, é então toda uma outra coisa: trata-se de introduzir a morte em um sistema que procura exclui-la que se acredita “zero em morte”, e em que o poder repousa nessa exclusão. A morte desaparece do sitema e o poder do Império repousa sobre essa espécie de “Não-morte”, de “não-fato”. É então que singularidades surgem, mas diferentes do discursos que elas sustentam. Eu não posso julgar a retórica islâmica, eu não consigo... É necessário tentar ver aquilo que está no ato, além da ideologia dos atores.”

Tradução: Augusto Patrini


« Ces histoires-là c'est du « rhabillage ». Si je veux analyser le terrorisme, je ne vais pas le faire en fonction du discours islamiste. C'est une façon d'exorciser les choses que de les renvoyer à une religion, à une idéologie, à une conviction. Si j'observe le terrorisme, c'est l'acte terroriste en tant que fracture d'une puissance mondiale. Cela peut venir de n'importe où, et qu'il y ait des convictions religieuses derrière ne m'intéresse pas. La résurgence des discours ethniques, religieux, linguistiques montre que quelque chose se crispe, se cristallise contre l'hégémonie, contre « l'empire », contre cette pensée unique, cette puissance unique. D'aucuns l'appellent un choc de cultures, un choc d'idéologies. Mais c'est insoluble. Prendre parti pour ou contre ne m'intéresse pas. Ce que je cherche à voir, c'est l'antagonisme véritable. Or, l'antagonisme se manifeste sur un mode symbolique, c'est donc tout autre chose : il s'agit de la mise en jeu de la mort dans un système qui cherche à exclure, qui se veut « zéro mort », et dont la puissance repose sur cette exclusion. La mort disparaît du système et le pouvoir de l'Empire repose sur cette espèce de non-mort, de non-événement. Alors des singularités surgissent, mais différentes du discours qu'elles tiennent. Je ne peux pas juger de la rhétorique islamiste, je n'y rentre pas... Il faut essayer de voir ce qu'il en est de l'acte en dehors de l'idéologie des acteurs. »
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[1] Entretien dans Le Philosophoire, op.cit., p.7
[2] Ibid., p.9
[3] Entretien in Le Philosophoire, pp.10-11

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