por Augusto Patrini Menna Barreto Gomes
ERASMO. Elogio da Loucura: Martin Claret, São Paulo: 2000.
O Elogio da Loucura de Erasmo de Rotterdam, é um texto de caráter satírico, que, porém guarda uma crítica mordaz aos costumes de muitos setores da sociedade européia de sua época. Neste texto, a própria loucura assume para si o papel de “narrador” – e empreende uma crítica sem citar explicitamente nenhuma personalidade. Dentre os principais criticados estão médicos, artistas, filósofos, sábios, príncipes e principalmente os religiosos. É sobre estes que cai com maior vigor a mordaz da “deusa Loucura”. Esta é responsável pela existência e permanência da maioria das instituições da época, denunciando-lhes a hipocrisia e a mediocridade.
A igreja parece ser o principal alvo de Erasmo, que pela voz da loucura critica sua hierarquia, atos e integrantes. Estes segundo eles, em nome de Cristo, fizeram “loucuras” como guerras, acumular poder e riqueza, esquecendo da caridade e simplicidade do “verdadeiro” cristianismo. Ele parece propor um retorno aos tempos iniciais do cristianismo.
Ele é especialmente duro e irônico com o Papa[1]: “Quem desejaria comprar[2], com todos os haveres, esse cargo eminente, ou quem, uma vez elevado ao mesmo, desejaria, para sustentar-se nele, empregar a espada, os venenos e toda sorte de violência? Ai! Quantos bens perderiam eles se a sabedoria se apoderasse por um instante do seu ânimo! A sabedoria?! Bastaria que tivessem um grãozinho apenas daquele sal de que fala o salvador. Perderiam então, aquelas imensas riquezas, aquelas honras divinas, aquele vasto domínio, aquele gordo patrimônio, aquelas faustosas vitórias, todos aqueles cargos, aquelas dignidades e aqueles ofícios que participam; todos aqueles impostos que percebem, quer nos próprios Estados, quer nos alheios; o fruto de todos os favores e de todas aquelas indulgências, com as quais vão traficando tão vantajosamente: aquela numerosa corte de cavalos, de mulas, de servos; aquelas delícias e aqueles prazeres de que gozam continuamente.” (p.95).
Este trecho do livro lembra-nos o quão ligados estavam ligados os religiosos às atividades e prazeres considerados anti-cristãs e mundanos na época de Erasmo.[3] De acordo com o historiador J. R. Hale em “A Europa Durante o Renascimento” (1971, p. 185) a influência dos papas ia muito além da esfera religiosa, penetrando profundamente nos domínios da política e até da economia. Além disso, na época os papas era criticados pela imoralidade, luxo, orgulho, manipulação e outros vícios apontados por Erasmo em O Elogio da Loucura. Um panfleto anônimo de 1501 declara: “Não há nenhuma forma de ultraje ou de vicio pratique abertamente no palácio do papa (...).”[4]. Erasmo afirma igualmente de forma irônica: “Graças a mim [a loucura], por conseguinte, é que nunca houve alguém que mais vivesse no ócio e na moleza do que um papa”.(p. 96). E ao falar sobre a ira o ódio dos papa afirma: “É verdade que nem ao menos poupam os corpos, e, inflamados elo zelo de Jesus cristo, desfraldam a bandeira de Marte, e sem piedade, empregam o fogo para sustentar suas razões. [...] os papas governam com sangue, como se nunca Jesus Cristo tivesse existido [...]” (p. 97), e segue com uma intensa condenação à guerra, associada aos instintos bestiais e ao inferno.
Parece que para Erasmo, a Igreja de Roma tornara-se materialista, egoísta, e possivelmente viciosa. No Elogio da Loucura ele parece fazer uma “pregação” em nome da simplicidade[5] e da ignorância – que possuíam, segundo ele, os primeiros apóstolos do cristianismo, e contratando estas qualidades com a prática e qualidade da classe religiosa de seu tempo. De acordo com Erasmo deste livro, ser cristão era basicamente imitar a vida de cristo e de seus apóstolos. É, no entanto curioso o fato que, apesar destas críticas, Erasmo não tenha se vinculado à reforma defendida por Lutero, já que sua crítica em muitos pontos concordava com as luteranas.
Bibliografia auxiliar:
HALE, J. R. A Europa Durante o renascimento (1480-1520). Lisboa: Editorial Presença, 1971.
[1] Os papas, e particularmente Júlio II serão atacados por Erasmo em Julius Exclusus.
[2] A Eleição do papa Alexandre VI foi injustamente considerada resultado de suborno.
[3] Eu poderia afirmar, que da mesma forma o mesmo ainda acontece em nossos dias. O historiador J. R. Hale nos lembra que na época de Erasmo: “O aristocrata-clérico tinha de abraçar o celibato, mas podia continuar a caçar, e a lutar, como fazia o bispo de Sens, que participou com Luís XII na campanha de Itália de armadura e lança em riste. O burguês-clérigo continuava como sempre a administrar contas, trocar e acumular terras e a envolver-se na luxúria pela qual seus colegas seculares eram tão criticados” (1971, p. 183). O cronista alemão Butzbach também descreve a vida dos religiosos como cheia de luxo, orgulho e orgias.
[4] In: Hale. 1971, p. 185
[5] No mesmo domínio religioso o livro também ridiculariza de forma bastante interessante os escolásticos e suas complicadíssimas interpretações das escrituras, que comportam a justificativa da guerra, do ódio e da soberba.
O Elogio da Loucura de Erasmo de Rotterdam, é um texto de caráter satírico, que, porém guarda uma crítica mordaz aos costumes de muitos setores da sociedade européia de sua época. Neste texto, a própria loucura assume para si o papel de “narrador” – e empreende uma crítica sem citar explicitamente nenhuma personalidade. Dentre os principais criticados estão médicos, artistas, filósofos, sábios, príncipes e principalmente os religiosos. É sobre estes que cai com maior vigor a mordaz da “deusa Loucura”. Esta é responsável pela existência e permanência da maioria das instituições da época, denunciando-lhes a hipocrisia e a mediocridade.
A igreja parece ser o principal alvo de Erasmo, que pela voz da loucura critica sua hierarquia, atos e integrantes. Estes segundo eles, em nome de Cristo, fizeram “loucuras” como guerras, acumular poder e riqueza, esquecendo da caridade e simplicidade do “verdadeiro” cristianismo. Ele parece propor um retorno aos tempos iniciais do cristianismo.
Ele é especialmente duro e irônico com o Papa[1]: “Quem desejaria comprar[2], com todos os haveres, esse cargo eminente, ou quem, uma vez elevado ao mesmo, desejaria, para sustentar-se nele, empregar a espada, os venenos e toda sorte de violência? Ai! Quantos bens perderiam eles se a sabedoria se apoderasse por um instante do seu ânimo! A sabedoria?! Bastaria que tivessem um grãozinho apenas daquele sal de que fala o salvador. Perderiam então, aquelas imensas riquezas, aquelas honras divinas, aquele vasto domínio, aquele gordo patrimônio, aquelas faustosas vitórias, todos aqueles cargos, aquelas dignidades e aqueles ofícios que participam; todos aqueles impostos que percebem, quer nos próprios Estados, quer nos alheios; o fruto de todos os favores e de todas aquelas indulgências, com as quais vão traficando tão vantajosamente: aquela numerosa corte de cavalos, de mulas, de servos; aquelas delícias e aqueles prazeres de que gozam continuamente.” (p.95).
Este trecho do livro lembra-nos o quão ligados estavam ligados os religiosos às atividades e prazeres considerados anti-cristãs e mundanos na época de Erasmo.[3] De acordo com o historiador J. R. Hale em “A Europa Durante o Renascimento” (1971, p. 185) a influência dos papas ia muito além da esfera religiosa, penetrando profundamente nos domínios da política e até da economia. Além disso, na época os papas era criticados pela imoralidade, luxo, orgulho, manipulação e outros vícios apontados por Erasmo em O Elogio da Loucura. Um panfleto anônimo de 1501 declara: “Não há nenhuma forma de ultraje ou de vicio pratique abertamente no palácio do papa (...).”[4]. Erasmo afirma igualmente de forma irônica: “Graças a mim [a loucura], por conseguinte, é que nunca houve alguém que mais vivesse no ócio e na moleza do que um papa”.(p. 96). E ao falar sobre a ira o ódio dos papa afirma: “É verdade que nem ao menos poupam os corpos, e, inflamados elo zelo de Jesus cristo, desfraldam a bandeira de Marte, e sem piedade, empregam o fogo para sustentar suas razões. [...] os papas governam com sangue, como se nunca Jesus Cristo tivesse existido [...]” (p. 97), e segue com uma intensa condenação à guerra, associada aos instintos bestiais e ao inferno.
Parece que para Erasmo, a Igreja de Roma tornara-se materialista, egoísta, e possivelmente viciosa. No Elogio da Loucura ele parece fazer uma “pregação” em nome da simplicidade[5] e da ignorância – que possuíam, segundo ele, os primeiros apóstolos do cristianismo, e contratando estas qualidades com a prática e qualidade da classe religiosa de seu tempo. De acordo com Erasmo deste livro, ser cristão era basicamente imitar a vida de cristo e de seus apóstolos. É, no entanto curioso o fato que, apesar destas críticas, Erasmo não tenha se vinculado à reforma defendida por Lutero, já que sua crítica em muitos pontos concordava com as luteranas.
Bibliografia auxiliar:
HALE, J. R. A Europa Durante o renascimento (1480-1520). Lisboa: Editorial Presença, 1971.
[1] Os papas, e particularmente Júlio II serão atacados por Erasmo em Julius Exclusus.
[2] A Eleição do papa Alexandre VI foi injustamente considerada resultado de suborno.
[3] Eu poderia afirmar, que da mesma forma o mesmo ainda acontece em nossos dias. O historiador J. R. Hale nos lembra que na época de Erasmo: “O aristocrata-clérico tinha de abraçar o celibato, mas podia continuar a caçar, e a lutar, como fazia o bispo de Sens, que participou com Luís XII na campanha de Itália de armadura e lança em riste. O burguês-clérigo continuava como sempre a administrar contas, trocar e acumular terras e a envolver-se na luxúria pela qual seus colegas seculares eram tão criticados” (1971, p. 183). O cronista alemão Butzbach também descreve a vida dos religiosos como cheia de luxo, orgulho e orgias.
[4] In: Hale. 1971, p. 185
[5] No mesmo domínio religioso o livro também ridiculariza de forma bastante interessante os escolásticos e suas complicadíssimas interpretações das escrituras, que comportam a justificativa da guerra, do ódio e da soberba.
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