O museu histórico deve ter como horizonte algumas metas. A primeira dela, como nos lembra o professor Ulpiano T. Bezerra de Menezes é o desenvolvimento e o fomento do exercício da crítica entre os cidadãos. Observando, portanto, essa premissa básica pode-se afirmar que o fomento da crítica pode ser estimulado quando há nas exposições um estímulo para a reflexão e para o pensamento analítico. O historiador deve trabalhar para que um museu histórico empreenda tal meta em suas exposições. È claro que, em acordo com o texto do professor, este estímulo à operação mental deve ser feita, nos museus históricos, por meio de objetos, transformados em documentos históricos, e pela guisa conciênte do historiador capaz de criar ou orientar em direção à uma relação de significados. Ou seja, por meio dos objetos, transformados em documentos, deve-se educar o público dos museus para que “façam a História”, pensem o passado por meio destes objetos - sem que estes sejam tornem-se fetiches, ícones, ou relíquia. No horizonte do profissional de história que trabalha no museu, assim como de seu público deve estar claro que o passado é irrecuperável e que essa operação mental será feita a partir do presente[1].
Tendo em vista estas afirmações fundamentais podemos observar duas coisas importantes: não há museu sem documentos históricos, sem objetos materiais. Penso, assim como o professor Ulpiano que não seria possível estimular relações analíticas críticas ( e autônomas) sobre o tempo sem os objetos materiais, vestígios materiais temporais - testemunhas da criação de uma memória histórica. Estes objetos materiais, segundos o professor Ulpiano devem necessariamente ser usados no espaço museal para criar articulações, sem que textos, de qualquer espécie (escritos ou de caráter tecnológicos), sobressaiam-se a eles. Deve-se ter claro que os museus históricos existem justamente para ensinar a fazer a “leitura” dos objetos materiais[2] enquanto documentos históricos, e não para apresentar uma ou mais versões históricas[3]. Assim, os museus históricos devem estar pautados em problemas historiográficos, e os objetos devem ser considerados portas para perguntas sobre o passado (relação dialética entre objeto e problemas históricos). Nesse sentido, deve-se considerar, que não é o objeto que fala, mas o historiador, mediante aos documentos e a recursos retóricos.
Outra questão fundamental, é que os museus devem ser lugares de produção de conhecimento histórico, ou seja, lugares onde os objetos matérias sejam pesquisados, coletados, repertoriados, conservados etc. Este trabalho deve ser feito profissionais ligados ao conhecimento histórico e contribuir para este conhecimento. Sem esta produção de conhecimento, os museus transformar-se-ão apenas em instrumentos ideológicos para doutrinação. É por isso, que os museus sem acervo, sejam aqueles baseados em meios informacionais[4] ou aqueles sem acervo permanente, deixam de ser museus. Eles até podem ser outras coisas, instrumentos culturais ou ideológico-pedagógicos - mas não museus, não do tipo que estimulam o pensamento crítico e o pensar sobre passado. Além disso, existe sempre o perigo, que os ditos museus sem acervo (modelo inglês e americano) acabem por abandonarem-se a um mercantilismo acrítico, que pode acabar por dominar todas as suas premissas, enfraquecendo suas dimensões críticas e políticas.
Com relação ao problema do caráter espetacular de algumas exposições várias restrições podem ser feitas. Antes de tudo, é fundamental a observação que museus, e seus objetos matérias em exposição, sejam de caráter histórico ou artístico não são produtos a serem consumidos, nem forma de lazer. Suas exposições como já foi dito devem ser portas para reflexões. O “consumo” de exposições montadas de forma “espetacular” que acaba acontecendo, sobretudo, nas grandes exposições (com ou sem financiamento privado) onde os objetos materiais, quando existem, são apresentados e vistos de forma acrílica e massiva.
Quanto ao que se refere a montagem e forma das exposições várias críticas podem ser feitas. No âmbito das instalações artísticas deve-se observar que elas não devem sobressair-se ao conteúdo crítico e histórico da exposição, não podem substituir as exposições analíticas. Além disso, há um grande risco no caso do museu histórico de se produzir verdadeiros e ridículos pastiches. No que se refere à recriação dos cenários ou contextualização dos objetos históricos, deve-se observar que o passado é uma dimensão humana que não pode ser recuperada, ou resgatada, além disso, pode-se criticar que ao se tentar recolocar o objeto em sua funcionalidade pode-se retirar sua capacidade de possibilitar o “repensar” do passado e a possibilidade de se fazer, criar ou guiar as relações com problemas históricos.[5]
O mais grave, porém, ao meu ver são as aberrações empreendidas pelos chamados “living museum”, opção meseologica que se propõe a recriar espaços, tempos, e sociedades. Além da já velha e batida observação que o passado é irrecuperável, observa-se freqüentemente nestas encenações o recurso a estereótipos grotescos, tanto no que se refere ás praticas sociais e culturais como no que se refere ao “tipos” humanos, apresentados de forma plana e vulgar. Essa “disneyficação” do passado não contribui para estimular o pensamento crítico, e muito menos para ensinar a pensar o passado.
[1] “Hoje grande parte das escolas historiográficas reconhece que há uma diferença entre o acontecimento (ou fato), no seu ethos e integridade ontológica e aquilo que o conhecimento histórico é capaz de apreender. A história é aquilo que experimentamos, o que vivenciamos, o ocorrido, o devir do mundo. O que o historiador faz (a História) pode ser visto como representação ou apresentação desse devir. Há bastante tempo o historiador não é mais escravo dos documentos e nem da busca pela “verdade histórica”, como dizia Lucien Febvre a História é antes aquilo que compreende e faz compreender.” (Gomes, Augusto. 2006)
[2] Que não devêm ter um caráter estetizante, nem de ícones ou objetos semióforos. Deve-se observar que os objetos não possuem nenhuma imanência (além das físico-químicas) e que os seus significados serão sempre criados necessariamente por meio de práticas sociais
[3] Muito menos para apresentar “fatos históricos” ao estilo bastante ultrapassado da história hankiana.
[4] Ex: Museu da Língua Portuguesa, que além de basear sua exposição em recursos da informática ainda adotou a preocupante postura de espetacularização, postura que não contribui em nada para a formação da consciência crítica. A mediação virtual também encerra um outro perigo, aquele de dominação.
[5] O deslocamento do ambiente de seu uso cotidiano descola o objeto de significados sociais e culturais que se se sobressaem se no contexto de uso. Uma maior liberdade para se estabelecer relações e mediações com problemas históricos, relações sociais e outros documentos acontece quando os objetos estão isolados.
Tendo em vista estas afirmações fundamentais podemos observar duas coisas importantes: não há museu sem documentos históricos, sem objetos materiais. Penso, assim como o professor Ulpiano que não seria possível estimular relações analíticas críticas ( e autônomas) sobre o tempo sem os objetos materiais, vestígios materiais temporais - testemunhas da criação de uma memória histórica. Estes objetos materiais, segundos o professor Ulpiano devem necessariamente ser usados no espaço museal para criar articulações, sem que textos, de qualquer espécie (escritos ou de caráter tecnológicos), sobressaiam-se a eles. Deve-se ter claro que os museus históricos existem justamente para ensinar a fazer a “leitura” dos objetos materiais[2] enquanto documentos históricos, e não para apresentar uma ou mais versões históricas[3]. Assim, os museus históricos devem estar pautados em problemas historiográficos, e os objetos devem ser considerados portas para perguntas sobre o passado (relação dialética entre objeto e problemas históricos). Nesse sentido, deve-se considerar, que não é o objeto que fala, mas o historiador, mediante aos documentos e a recursos retóricos.
Outra questão fundamental, é que os museus devem ser lugares de produção de conhecimento histórico, ou seja, lugares onde os objetos matérias sejam pesquisados, coletados, repertoriados, conservados etc. Este trabalho deve ser feito profissionais ligados ao conhecimento histórico e contribuir para este conhecimento. Sem esta produção de conhecimento, os museus transformar-se-ão apenas em instrumentos ideológicos para doutrinação. É por isso, que os museus sem acervo, sejam aqueles baseados em meios informacionais[4] ou aqueles sem acervo permanente, deixam de ser museus. Eles até podem ser outras coisas, instrumentos culturais ou ideológico-pedagógicos - mas não museus, não do tipo que estimulam o pensamento crítico e o pensar sobre passado. Além disso, existe sempre o perigo, que os ditos museus sem acervo (modelo inglês e americano) acabem por abandonarem-se a um mercantilismo acrítico, que pode acabar por dominar todas as suas premissas, enfraquecendo suas dimensões críticas e políticas.
Com relação ao problema do caráter espetacular de algumas exposições várias restrições podem ser feitas. Antes de tudo, é fundamental a observação que museus, e seus objetos matérias em exposição, sejam de caráter histórico ou artístico não são produtos a serem consumidos, nem forma de lazer. Suas exposições como já foi dito devem ser portas para reflexões. O “consumo” de exposições montadas de forma “espetacular” que acaba acontecendo, sobretudo, nas grandes exposições (com ou sem financiamento privado) onde os objetos materiais, quando existem, são apresentados e vistos de forma acrílica e massiva.
Quanto ao que se refere a montagem e forma das exposições várias críticas podem ser feitas. No âmbito das instalações artísticas deve-se observar que elas não devem sobressair-se ao conteúdo crítico e histórico da exposição, não podem substituir as exposições analíticas. Além disso, há um grande risco no caso do museu histórico de se produzir verdadeiros e ridículos pastiches. No que se refere à recriação dos cenários ou contextualização dos objetos históricos, deve-se observar que o passado é uma dimensão humana que não pode ser recuperada, ou resgatada, além disso, pode-se criticar que ao se tentar recolocar o objeto em sua funcionalidade pode-se retirar sua capacidade de possibilitar o “repensar” do passado e a possibilidade de se fazer, criar ou guiar as relações com problemas históricos.[5]
O mais grave, porém, ao meu ver são as aberrações empreendidas pelos chamados “living museum”, opção meseologica que se propõe a recriar espaços, tempos, e sociedades. Além da já velha e batida observação que o passado é irrecuperável, observa-se freqüentemente nestas encenações o recurso a estereótipos grotescos, tanto no que se refere ás praticas sociais e culturais como no que se refere ao “tipos” humanos, apresentados de forma plana e vulgar. Essa “disneyficação” do passado não contribui para estimular o pensamento crítico, e muito menos para ensinar a pensar o passado.
[1] “Hoje grande parte das escolas historiográficas reconhece que há uma diferença entre o acontecimento (ou fato), no seu ethos e integridade ontológica e aquilo que o conhecimento histórico é capaz de apreender. A história é aquilo que experimentamos, o que vivenciamos, o ocorrido, o devir do mundo. O que o historiador faz (a História) pode ser visto como representação ou apresentação desse devir. Há bastante tempo o historiador não é mais escravo dos documentos e nem da busca pela “verdade histórica”, como dizia Lucien Febvre a História é antes aquilo que compreende e faz compreender.” (Gomes, Augusto. 2006)
[2] Que não devêm ter um caráter estetizante, nem de ícones ou objetos semióforos. Deve-se observar que os objetos não possuem nenhuma imanência (além das físico-químicas) e que os seus significados serão sempre criados necessariamente por meio de práticas sociais
[3] Muito menos para apresentar “fatos históricos” ao estilo bastante ultrapassado da história hankiana.
[4] Ex: Museu da Língua Portuguesa, que além de basear sua exposição em recursos da informática ainda adotou a preocupante postura de espetacularização, postura que não contribui em nada para a formação da consciência crítica. A mediação virtual também encerra um outro perigo, aquele de dominação.
[5] O deslocamento do ambiente de seu uso cotidiano descola o objeto de significados sociais e culturais que se se sobressaem se no contexto de uso. Uma maior liberdade para se estabelecer relações e mediações com problemas históricos, relações sociais e outros documentos acontece quando os objetos estão isolados.
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